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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR MINISTRO PRESIDENTE DO COLENDO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
LUCCAS DUMAR ROQUE, brasileiro, advogado inscrito na OAB/RJ, sob o número 231.813, e VICTOR CORREIA SILVA, advogado inscrito na OAB/RJ, sob o número 248.801 com endereço profissional , localizado na Avenida das Américas, n° 2901 - Edifício Barra Business Center - sala 302, Barra da Tijuca-RJ onde recebem intimações, vêm, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento no artigo 5º, LXVIII, da Constituição Federal e arts. 647, 648, e seus incisos do CPP, impetrar ordem de
HABEAS CORPUS
em favor de CLAUDIO SANT’ANA DE MATOS, brasileiro, solteiro, aposentado, portador da carteira de identidade de nº 08032544 DETRAN/RJ, inscrito no CPF nº 000.225.677-04, contra ato do eminente relator Desembargador Paulo de Tarso Neves do HC nº 0075500-33.2024.8.19.0000 da Quinta Câmara Criminal do TJ/RJ
I - DOS FATOS
O paciente tomou conhecimento do mandado de prisão em aberto, na oportunidade da prisão de Fradmilson, seu afilhado, ao querer saber mais informações do processo, foi surpreendido quando observou que seu nome também constava nos autos, figurando como réu da ação penal.
Compulsando os autos, verifica-se que o paciente é acusado da prática, em concurso material, dos crimes previstos nos arts. 171, 158 § 1º e 288, todos do Código Penal.
Cumpre informar ainda, que em momento algum o réu foi intimado para prestar algum esclarecimento, ou ao menos para que pudesse apresentar a sua defesa, observando o risco de ser preso de crimes que sequer teve conhecimento de que cometeu.
Na decisão que deferiu o pedido de prisão preventiva, o Juiz considerou a existência dos requisitos e pressupostos presentes no art. 312 do Código Processual Penal, quais sejam: fumus comissi delicti e o periculum libertatis. O primeiro, segundo o magistrado, por supostamente restar comprovado que o paciente auxiliava na gestão do esquema criminoso e na logística de alteração de sinais identificadores dos veículos.
Sobre o segundo critério, o Juízo alegou a necessidade da custódia cautelar, pela gravidade dos crimes, necessitando resguardar a sociedade e a ordem pública. Mencione-se que, o magistrado não observou no teor da decisão a possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, conforme art. 319 do CPC, procedendo com a decretação da prisão preventiva do acusado.
Deste modo, dada a flagrante violação do direito de liberdade do paciente, foi impetrado o Habeas Corpus junto à Quinta Câmara Criminal do TJ/RJ.
Ocorre que, conforme decisão monocrática do Desembargador Relator, foi indeferida a concessão da liminar, em cognição sumária. Destacando-se que não apontou-se qualquer fundamento para a referida decisão, tampouco se observou o princípio da primazia do julgamento do mérito.
II - DA INADEQUAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA
Observando o teor da sentença e da realidade dos fatos, torna-se notório a inadequação dos pressupostos presentes no art.312 do CPP, para a prisão preventiva do acusado Cláudio.
Em relação à incidência do fumus comissi delicti, mencione-se que o acusado sequer era envolvido nas supostas práticas delituosas. Ocorre que, o Fradmilson é afilhado do réu Cláudio, e que realmente possuía relação próxima com este, contudo, acusado não tinha conhecimento que aquele supostamente praticava atividades de estelionato e extorsão.
Cabe informar que, nas oportunidades em que o seu afilhado entrava em contato, era para conversar sobre os bens que tinha e sobre as questões relacionadas a um sítio que administravam juntos, com a criação de animais.
Mencione-se que o acusado Cláudio sobre a presença de um maquinário de obra no terreno, ao questionar o Fradmilson sobre, lhe foi informado que se tratava de uma escavação de fosso, para a formação de um lago artificial, para criação de peixes.
Cumpre salientar que, o paciente, não sabia da procedência desse bem, e avisou ao Fradmilson que ele retirasse a máquina assim que terminasse a escavação do fosso. O paciente informa ainda, que na oportunidade da prisão de Fradmilson o maquinário já não se encontrava mais no terreno e que não sabe informar o destino desse veículo.
Neste sentido, o paciente não reconhece as imagens retiradas do telefone de Fradmilson, e que essas conversas são completamente discrepantes dos assuntos que normalmente eram tratados pelos dois.
Informe-se ainda que, não teria como relacionar a pessoa presente nesses contatos com o denunciado, desta forma, comprometendo o critério da autoria do crime e que consequentemente descaracteriza o fumus comissi delicti.
Neste sentido as provas obtidas que supostamente incriminam o paciente, não perfazem todo o lastro probatório indiciário complexo, somente baseando a autoria e materialidade do fato em meros indícios.
Cumpre mencionar que a questão do lastro probatório indiciário complexo é um tema que surge no contexto da avaliação de provas derivadas de indícios que, por si só, não têm força conclusiva, mas que, em conjunto com outros elementos, podem fornecer uma base sólida para decisões judiciais. Isso é particularmente relevante quando se discute a admissibilidade e o valor probatório de prints de conversas de celular, uma vez que tais registros digitais podem ser facilmente manipulados, distorcidos ou descontextualizados.
No presente caso, não foram observados elementos como testemunhos, perícia técnica, localizador de ID, metadados do usuário; que pudessem transformar as provas obtidas em indícios complexos com potencial para formar o convencimento do juiz.
Neste sentido, vale considerar o entendimento do presente Tribunal, disposto no informativo nº 811 de 2024:
O instituto da cadeia de custódia, arts. 158-A e seguintes do CPP, visa a garantir que o tratamento dos elementos probatórios, desde a sua arrecadação até a análise e deliberação pela autoridade judicial, seja idôneo e livre de qualquer interferência que possa macular a confiabilidade da prova.
No caso, discute-se a inidoneidade de relatório de análise de extração de dados baseado em print screen de diálogos entre usuários de Whatsapp.
Diante da volatilidade dos dados telemáticos e da maior suscetibilidade a alterações, imprescindível se faz a adoção de mecanismos que assegurem a preservação integral dos vestígios probatórios, de forma que seja possível a constatação de eventuais alterações, intencionais ou não, dos elementos inicialmente coletados, demonstrando-se a higidez do caminho percorrido pelo material.
Mostra-se indispensável que todas as fases do processo de obtenção das provas digitais sejam documentadas, cabendo à polícia, além da adequação de metodologias tecnológicas que garantam a integridade dos elementos extraídos, o devido registro das etapas da cadeia de custódia, de modo que sejam asseguradas a autenticidade e a integralidade dos dados.
Dessa forma, pode-se dizer que as provas digitais, em razão de sua natureza facilmente - e imperceptivelmente - alterável, demandam ainda maior atenção e cuidado em sua custódia e tratamento, sob pena de ter seu grau de confiabilidade diminuído drasticamente ou até mesmo anulado.
(...)
A documentação de cada etapa da cadeia de custódia é fundamental, a fim de que o procedimento seja auditável. É dizer, as partes devem ter condições de aferir se o método técnico-científico para a extração dos dados foi devidamente observado (auditabilidade da evidência digital).
Assim, a auditabilidade, a repetibilidade, a reprodutibilidade e a justificabilidade são quatro aspectos essenciais das evidências digitais, os quais buscam ser garantidos pela utilização de metodologias e procedimentos certificados, como, e.g., os recomendados pela ABNT. A ausência de quaisquer deles redunda em um elemento epistemologicamente frágil e deficiente, e, portanto, de valor probatório reduzido ou nulo.
A observação do princípio da mesmidade visa a assegurar a confiabilidade da prova, a fim de que seja possível se verificar a correspondência entre aquilo que foi colhido e o que resultou de todo o processo de extração da prova de seu substrato digital.
Uma forma de se garantir a mesmidade dos elementos digitais é a utilização da técnica de algoritmo hash, a qual deve vir acompanhada da utilização de um software confiável, auditável e amplamente certificado, que possibilite o acesso, a interpretação e a extração dos dados do arquivo digital.
No caso, quando da sentença condenatória, o juízo singular pontuou que a "análise se deu após consulta direta ao aparelho, sem necessidade de uso de máquinas extratoras (ex. Cellebrite).", não sendo possível inferir a idoneidade das provas extraídas pelo acesso direto ao celular apreendido, sem a utilização de ferramenta forense que garantisse a exatidão das evidências, não havendo registros de que os elementos inicialmente coletados são idênticos ao que corroboraram a condenação.
De relevo, o entendimento majoritário desta Quinta Turma no sentido de que "é ônus do Estado comprovar a integridade e confiabilidade das fontes de prova por ele apresentadas. É incabível, aqui, simplesmente presumir a veracidade das alegações estatais, quando descumpridos os procedimentos referentes à cadeia de custódia" (AgRg no RHC 143.169/RJ, relator Ministro Messod Azulay Neto, relator para acórdão Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe de 2/3/2023).
Assim, inafastável a conclusão de que, in casu, não houve a adoção de procedimentos que assegurassem a idoneidade e a integridade dos elementos obtidos pela extração dos dados do celular do corréu. Logo, evidente o prejuízo causado pela quebra da cadeia de custódia e a imprestabilidade da prova digital.
AgRg no HC 828054 / RN AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS 2023/0189615-0 Ministro JOEL ILAN PACIORNIK (DESTACOU-SE.ABREVIOU-SE)
Assim, a decretação da prisão preventiva constitui uma coação ilegal contra o paciente, tratando-se de uma medida extremamente desnecessária, uma vez que a materialidade e autoria do fato criminoso não foi devidamente comprovada.
Com relação ao critério do periculum libertatis, presente no art. 312 do Código de Processo Penal, cumpre mencionar que a liberdade de Cláudio durante a instrução criminal em nada compromete a ordem pública, ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou a aplicação da lei penal.
Mencione-se que o paciente não possui antecedentes criminais, que afasta a possibilidade deste retornar a prática dos supostos crimes. Sobre os riscos à ordem pública e à instrução criminal, pontua-se que o acusado é aposentado e possui residência fixa, desta forma, tornando improvável algum risco de fuga e garantindo a efetiva participação deste na instrução do processo.
Deste modo, não deve ser caracterizado o periculum libertatis, tendo o paciente, condições de responder ao processo em liberdade, sem apresentar ameaça ao andamento da ação penal.
Na hipótese do magistrado ainda entender necessária a utilização de medidas cautelares a fim de assegurar a ordem pública e assegurar a aplicação da lei penal, pugna considerar a aplicação das medidas cautelares diversas da prisão, conforme arts. arts. 282 e 319 do CPC, respeitando ainda o princípio de que a pena de prisão só poderá ser aplicada apenas quando outras medidas menos severas forem inadequadas para atingir os objetivos de prevenção e repressão de crimes.
III - DA DECISÃO DO RELATOR DESEMBARGADOR
Conforme já informado, a decisão do ilustríssimo magistrado não abordou os fundamentos do indeferimento da liminar, bem como não apreciou a primazia do julgamento do mérito, na hipótese de algum vício.
Deste modo, torna-se claro que o magistrado não observou adequadamente o mérito da questão, que gera a percepção de que a decisão foi proferida de forma arbitrária ou baseada apenas em questões processuais, sem uma análise profunda das razões que justificariam ou não a concessão da ordem de liberdade.
Portanto, o princípio da primazia do julgamento do mérito é violado quando a análise da causa não atinge seu objetivo final, que seria a apreciação completa e justa do direito alegado, comprometendo a tutela judicial efetiva.
Diante do exposto, em face da verdadeira coação ilegal, de que é vítima o paciente, vem requerer que, seja concedida a ordem impetrada, conforme artigo 648, inciso I do Código de Processo Penal, decretando-se a revogação da prisão preventiva decretada contra o paciente.
Termos em que,
Pede deferimento.
Rio de Janeiro, 23 de setembro de 2024.
LUCCAS DUMAR ROQUE
OAB/RJ nº 231.813
VICTOR CORREIA SILVA
OAB/RJ nº 248.801